Friday, June 16, 2006

Suspiro

A conversa trazia-lhe demasiadas recordações.
Das boas. Das dolorosas, portanto.
Dos pequenos nadas do dia-a-dia, que há já muito lhe não pertenciam.
Tinha outros, os seus, os novos.
Mas, por efeito do Desencanto, nenhum lhe servia agora de grande consolo.
Perdera milhares de concertos, lançamentos de livros, viagens de combóio rumo a festivais de cinema em nobres vilas.
Perdera os pequenos almoços em cafés envidraçados e os "raptos" para jantares cansados, mas reconfortantes, no fim de um intenso dia de trabalho.
Perdera os teatros interactivos, com jantar incluído, que se espraiavam por botânicos jardins e os espectáculos incompreensíveis de danças com "contemporâneo" no nome.
Perdera os silêncios cúmplices e as confissões envergonhadas, de quem não aprendeu ainda a confiar.
Perdera as birras de maridos inconcebivelmente ciumentos e as descidas de rios com colegas que não sabiam nadar.
Perdera as viagens de autocarro e as intermináveis voltas à procura de um lugar para o seu precioso megane.
Perdera um excelente ambiente de trabalho e desafios que lhe estimulavam a mente arguta.
Ganhara tantas outras coisas boas...
Mas aquela Bruxa Má do Oeste estava a conseguir bloquear-lhe todas essas constatações.
Por isso a conversa lhe trazia demasiadas recordações.

Suspirou - Que saudades de ser senhor de si próprio.
Um pequeno amontoado de ar que significava um profundo grito de alma.

Ouviu-se aqui.


Cumprimentos a Macau